Sobre Hildegard Angel

colunadahilde@gmail.com Hildegard Angel é uma das mais respeitadas jornalistas do Rio de Janeiro. Durante mais de 30 anos foi colunista no jornal O Globo, quer cobrindo a sociedade (com seu nome e também com o pseudônimo Perla Sigaud), quer cobrindo comportamento, artes e TV, tendo assinado por mais de uma década a primeira coluna de TV daquele jornal. Nos últimos anos, manteve uma coluna diária no Jornal do Brasil, onde também criou e editou um caderno semanal à sua imagem e semelhança, o Caderno H. Com passagem pelas publicações das grandes editoras brasileiras - Bloch, Três, Abril, Carta, Rio Gráfica - e colaborações também em veículos internacionais, Hildegard talvez seja a colunista social com maior trânsito

BRASIL: A IMINÊNCIA DO APOCALIPSE OU A REDENÇÃO DEMOCRÁTICA?

Hildegard Angel

Era o segundo governo de Lula. Num almoço de mulheres no Fasano, a dona de uma rede nacional de shopping centers dizia que eles nunca haviam vendido tanto quanto naqueles anos. O governo era criticado pelos seus opositores por favorecer os bancos, e os banqueiros pareciam amar Lula, com quem confraternizavam onde estivessem. A indústria brasileira tinha seu representante na vice-presidência, José Alencar Gomes da Silva, e as federações patronais também pareciam contentes.

Lula não perseguia a mídia, seu governo anunciava, privilegiando os grandes grupos de imprensa, não havia retaliações aos divergentes, como hoje vemos acontecer. Nos governos de Dilma, sequer foi encaminhado ao Congresso o projeto de regulação da mídia, formatado por Franklin Martins ao fim do segundo mandato de Lula, condizente com o que é feito nos países do mundo todo.

Lula é um conciliador por natureza. É altamente considerado pelos chefes de estado do resto do mundo, é admirado, visto como um igual. Semana passada, em Bruxelas, ele mereceu aplausos de pé, longos e sucessivos, em encontro do Parlamente Europeu com lideranças latino americanas. Mereceu recepção de chefe de estado no Elysée, com a marcha da guarda do palácio, e o presidente Macron descendo os degraus para ir busca-lo (e uma hora depois levá-lo) no carro. É bem visto pela mídia internacional, inclusive pelas publicações de economia. Por que esse ódio da mídia corporativa brasileira contra ele? Esse apagamento? Esse silêncio a seu respeito? Por que estavam sendo destinados a ele apenas breves momentos, em canais por assinatura, às altas horas da noite, e quando isso acontecia? E isso só foi revertido no sétimo dia da agenda da viagem de Lula, depois da grande grita nas redes sociais, da indignação, e da chacota feita, comparando a vasta cobertura da visita pelos jornais estrangeiros e a cobertura Zero pela mídia brasileira.

Atribuem a Lula um radicalismo que ele, na prática, nunca demonstrou. Lula não é um radical.  Não é comunista. É um liberal, falando francamente. Alguns o identificam como Liberal Periférico. Sua política externa é afinada com as dos demais países. Respeitado por todos. Até George W. Bush gostava dele! Em poucos dias na Europa, foi recebido pelo vencedor das eleições na Alemanha, Olaf Scholz, esteve com o líder da Social Democracia, Martin Schulz, foi aclamado no Parlamento Europeu, elogiado por Zapatero como “o que mais combateu a pobreza”, trocou ideias com o Nobel da Economia, Joseph Stiglitz, foi recepcionado com batucada brasileira pelos alunos do Instituto SciencesPo, em Paris, onde almoçou com a Prefeita. Depois da França, participa hoje de seminário de Cooperação multilateral e recuperação pós-covid, em Madri, e tem agenda com o primeiro-ministro.

Lula não sai procurando briga, não dá banana e joga a casca no chão, não desanca país dos outros, negocia com todos. Internamente, é bom para o nosso povo, se compadece dos pobres. Não politiza temas sérios, como Saúde, Cultura, Educação. Desenvolveu políticas socais mínimas, sem “exagero”, podia ser muito mais – o Bolsa-Família, como diriam os americanos, eram “peanuts” em nosso orçamento. E mesmo assim suas políticas públicas trouxeram notáveis benefícios sociais e econômicos, foram copiadas em vários países, se tornaram referência.

O saldo de seu Minha Casa Minha Vida foram casas para milhões de brasileiros, e novas grandes fortunas para poucos, como Rubens Menin, dono da MRV Engenharia, proprietário da CNN Brasil, o também mineiro Ricardo Gontijo, dono da Direcional Engenharia, os donos da Construtora Tenda, mineira também, os da Rossi Residencial, alguns desses empresários declarados admiradores de Bolsonaro.

As ditas pautas identitárias, responsabilizadas por parte da rejeição ao PT, foram muito mais de Dilma do que de Lula. Assim como foi o relatório da Comissão da Verdade, que tanto enraiveceu os militares de pijama do Clube Militar.

Lula jamais perseguiu os diferentes, nem exigiu fidelidade ideológica aos que prestam serviços ou vendem serviços ao governo. Muito menos àqueles que recorrem aos financiamentos e incentivos de bancos públicos.

É simplismo achar que essa aversão se deve ao preconceito da burguesia por Lula ter sido um sindicalista, operário, nordestino, de origem muito pobre?

A lenda de que o PT inventou a corrupção no Brasil foi tão repetida que se tornou verdade. Sabemos que os casos de corrupção no Brasil remontam a Pero Vaz de Caminha, quando os portugueses davam espelhinho e recebiam pepitas de ouro. E sabemos que, no ranking da corrupção dos partidos políticos brasileiros, o PT é um dos melhores colocados, isto é, está em penúltimo lugar. Sem esquecer que foi o PT que criou o Portal da Transparência e os mecanismos que permitiram investigações e punições de casos de corrupção. Por que isso é ignorado? Por que as impropriedades, vamos chamar assim, da Lava Jato, de Sergio Moro, do TRF-4 são ignoradas? As delações e provas falsas? Os processos contra Lula, comprovadamente mais ocos do que cheque voador? E ainda a ironia de as notas fiscais das reformas do dito “tríplex do Lula” e do sítio, ambos em São Paulo, serem do comércio de Curitiba…

Sergio Moro se lança como terceira via, fazendo soar as fanfarras de sua fada madrinha, a Globo, com o muito provável respaldo do alto oficialato das Forças Armadas, simpáticas ao ex-juiz sob suspeição e agastadas com Bolsonaro – o embrulho veio muito pior do que a encomenda.

Generais não deverão poupar apoio ao maringaense, até porque nesses casos há acordos de parte a parte. Dos militares, apoio do tipo que Villas Boas deu ao Mito. De Moro, provavelmente, a promessa de não lhes retirar regalias, cargos e rendimentos adquiridos nos últimos anos.

Moro surge na disputa para roubar parte do eleitorado de Bolsonaro, não a fatia dos fanáticos, mas a da burguesia cheirosa, que apertou 17 pela ojeriza ao PT. Todavia, com todo o foguetório global, o “juiz ladrão” (royalties para o deputado Glauber Braga) dificilmente chegará aos dois dígitos no percentual das urnas. E como os generais não são de terceirizar o poder (quando há “clima” para o golpe), quem subiria a rampa seria um deles.

E por que essa eleição de 2022 se reveste de cores dramáticas, como se fosse iminência de um apocalipse ou única possibilidade de redenção democrática para o Brasil?

Porque ainda há, porque nos assombra, a possibilidade de uma reeleição de Bolsonaro. Mesmo que sua popularidade decline, mesmo que ele carregue mais de 600 mil mortes nas costas, mesmo que ele nos submeta a vexames locais, internacionais, interestelares, até. Tudo é tão sem sentido no Brasil de hoje, tão ficcional, que até o impossível é possível. Vide a eleição do completo desconhecido Witzel, no Rio de Janeiro. Que forças subterrâneas se moveram para isso?

A atual polarização direita x esquerda esvaziou o raciocínio político dos brasileiros, tornando simplórias as suas mentes. A razão deu lugar à paixão. Essa radicalização não existia, surgiu a partir de Bolsonaro, fazendo, da escolha política, uma torcida de futebol. Torcem por Bolsonaro, como quem torce pelo Vasco. Ninguém deixa de ser Flamengo porque ele perde um campeonato. Ou dois, ou três, ou 10. A escolha do time “do coração” é um estado de espírito, é aleatória ou é por influência de terceiros. E depois que se decide por ele, esqueçam, porque o torcedor não muda de jeito nenhum.

Daí que os 20 e poucos por cento de fanáticos bolsonaristas não vão mudar de preferência, porque o que está posto não é a ideologia nem a coerência, é a camisa do time. E eles escolheram a da Seleção Brasileira de Futebol!

Não é o projeto de Bolsonaro para o Brasil que conta, porque nem projeto ele tem, jamais apresentou um, sequer isso lhe cobraram. Bolsonaro não precisa cumprir, porque nada prometeu. Nada de bom. Prometeu armar todo mundo, acabar com o horário de verão e retirar os “pardais” do trânsito. Isso ele fez. Declarou que os filhos vinham em primeiro lugar, e que o filet mignon seria pra eles. Isso também tem cumprido ao pé da letra.

Nós nos tornamos um país de ignorantões, liderado por um ignorantão mor. Para quê escolas, se a burrice se tornou padrão? Para quê Enem, se até ele, que é burro, entende mais do que a comissão de mestres? Pra quê verdade, se as fake news são muito mais saborosas? Pra quê livros de História, se livros têm letras demais?

Sabemos das pretensões de Bolsonaro apenas pelas declarações feitas à imprensa nos tempos de deputado. “Se eu fosse presidente da República daria golpe no mesmo dia”. “O Congresso não vale pra nada”. “Sonego tudo que for possível. Se puder não pagar nota fiscal eu não pago, porque o dinheiro vai para o ralo, vai para a sacanagem”. “O voto não vai mudar nada no Brasil. Só vai mudar quando partirmos para uma guerra civil, fazendo o que o regime militar não fez. Matando uns 30 mil. Vão morrer alguns inocentes. Tudo bem. Em toda guerra, morrem inocentes.”

Podiam ser piores as intenções? Depois da incitação ao uso de armas e da sua liberação, inclusive as de grande porte, em grande quantidade, a última novidade é a aprovação pela Comissão de Segurança Pública da Câmara dos Deputados de um Projeto de Lei que permite o porte de arma para os praças das Forças Armadas – suboficial, subtenente, sargento, cabo, soldado e marinheiro – representantes de forte extrato de fanatizados pelo Mito. Somem-se a eles os milicianos, os posseiros, os invasores de terras, os garimpeiros ilegais, e agora sabemos que até narcotraficante foragido, o “Grota”, ligado ao PCC, é favorecido pelo Governo Bolsonaro com 18 autorizações para garimpar. Quantos “Grotas” têm merecido favores desse governo? Dezenas? Centenas? Milhares? Quantos chefes de bando? Quantos “Comandos”, facções do crime? Já virou até meme nas redes sociais a quantidade de bandidos, contrabandistas, delinquentes, fraudadores, marginais, ladrões, pilantras flagrados, que, quando conferimos seus perfis nas redes sociais, são bolsonaristas declarados.

Dar um golpe, provocar uma “guerra civil” é declarada obsessão de Bolsonaro, para quem “só Deus” o tira da cadeira. Não é o voto, não são as urnas, não é a preferência da maioria. Só uma força superior. E se não houver nova fakeada? E se ele for obrigado a participar de um debate? E se, mesmo com toda a manipulação dos algoritmos, através das fake News, dos votos de cabresto dos milicianos, das ordens expressas dos padres e pastores aos fiéis ele não consiga ser eleito? E se Lula vencer, como tudo indica? Bolsonaro irá recorrer à “força superior” das armas desse exército de transviados e obcecados, que é de fato dele?

Talvez a saída seja colocar uma imaginária faixa amarela de “interditado”, dividindo a porção do Brasil doente, intoxicado pelo bolsonarismo, da porção do Brasil são, e tocar a vida e a campanha no país real, com propostas verdadeiras e factíveis, com projetos de amanhã. Acreditar que a ordem Democrática pode ser recuperada, as instituições resgatadas, e que o Brasil ainda pode ser reconstruído,  sejam seus atuais controladores os milicianos ou o mercado financeiro, o narconegócio ou o agronegócio, a bancada evangélica ou a bancada da bala, os latifundiários grileiros ou as federações patronais com suas pautas anti-trabalhador, a mídia corporativa ou a indústria de fake News, o punitivismo lavajatista de falsos catões ou a esbórnia das malas de dinheiro, os entreguistas de nossa soberania ou os militares impatriotas, o PCC ou o Comando Vermelho.

Vamos colocar nossa energia no candidato de nossas esperanças, conscientes que, mais do que nunca, só sairemos desse impasse em que nos encontramos elegendo um Congresso comprometido com um projeto político que favoreça a Nação brasileira, não apenas as conveniências pessoais, paroquiais, e muito menos os compromissos religiosos obscurantistas de cada um.

O povo brasileiro é aberto e fraterno – a gente até deixou de acreditar nisso. O brasileiro abraça as novidades com ternura e fôlego. Assume agilmente as transformações sociais, tecnológicas, de costumes. O vento renovador que bate leve lá fora, aqui é ventania. Assim, fomos dos primeiros a oficializar as uniões homoafetivas, nosso ensino é aberto e criativo, assim como é a atividade cultural. A contribuição científica brasileira é reconhecida internacionalmente. Nos grupos sociais mais progressistas, caminhamos muito contra o racismo, o machismo, os preconceitos em geral. Nossa capacidade de trabalho é indiscutível.

Todos os dias, aprendemos no manual da sobrevivência. Não vamos mais delegar a uma burguesia preconceituosa, burra, inculta, iletrada até, o leme de nosso futuro. E vamos querer de volta tudo que foi construído pelo povo e vendido na bacia das almas.

Borbulhando com a musa da sofrência, Marília Mendonça agora 15 quilos mais magra…

Escrevi esse texto em 26 junho de 2018, na coluna diária de página inteira que mantinha no Jornal do Brasil, impresso e digital. E mais que de repente, com um voo trágico alçando à morte Marília Mendonça, e a partir de um obituário desastrado na Folha de São Paulo, o assunto é trazido à pauta, porém sem sentimento, sem empatia, sem conhecimento de causa.

Por isso, neste domingo emocionado, retomo um debate proposto há mais de três anos, no formato da coluna diária.

NA OITAVA NOITE de shows e festa no palco da cidade de Petrolina, Marilia Mendonca fez vibrar aquele mundo de fãs com sua nova forma física, 15 quilos a menos… MARÍLIA E AS “sofrência girls” representam muito mais do que um estilo musical. Elas surgiram como um fenômeno do empoderamento feminino no showbiz, bem como na estética… ELAS PERSONIFICAM a boa notícia de que vivemos uma época não só de revisão de antigos padrões de comportamento, mas também de padrões de beleza… EM UM PASSADO não tão distante, ter um “corpo perfeito” já significou ser gordinha, o que para a sociedade era sinônimo de saúde e fartura econômica… POR OUTRO lado, na década de 1990, com o advento do “heroin chic” e das “super models” magérrimas, nos tornamos escravas da balança, tentando assumir um padrão extremamente ingrato ao biotipo avantajado da brasileira… LOGO DEPOIS, nos anos 2000, veio o boom dos silicones, com os super seios turbinados, influência nítida da cultura norte-americana com seu fetiche por peitões… EM NOSSA sociedade sempre patriarcal, essa busca pelo corpo perfeito é extremamente cruel e nos torna, muitas vezes, infelizes e frustradas… DE FATO, ISSO se tornou cansativo e sem graça (eu cansei, e você?)… O RENASCIMENTO feminista e a atual onda de representatividade são só alguns exemplos nítidos impulsionados pelas novas gerações Y e Z…  EMPODERADAS, INFORMADAS e ultraconectadas, elas vêm chacoalhando o status quo, desafiando paradigmas. Com isso movimentos, como o Body Positive, ganham cada vez mais força…. LIVRE DE JULGAMENTOS sobre padrões estéticos, o que tais movimentos pregam é a auto-aceitação do corpo e o amor próprio, promovendo a pluralidade da beleza… LÁ FORA, Beyoncé e Kim Kardashian, com suas formas curvilíneas e os quadris largos, contribuíram para que a mulherada brasileira resgatasse o orgulho de seu corpo natural… POR AQUI, as maiores representantes desse novo momento empoderado são elas, as nossas musas do feminejo, as gloriosas da sofrência. Marília Mendonça, Maiara e Maraisa, Simone, da dupla com Simaria, e Naiara Azevedo dão aula de autoestima e aceitação… TODAS LINDAS, com suas curvas naturalmente sensuais e confiantes de si mesmas: de minissaia, shortinho, legging, vestidinho, corselet e com decotes acentuados, vêm influenciando a nossa mulherada de maneira positiva… POR ISSO, minha querida Marília Mendonça, se você tiver vontade, pode parar seu emagrecimento nos 15 quilinhos e ser feliz, porque você já impôs sua beleza. Não foi a beleza convencional que se impôs a você… ESTAMOS, FINALMENTE, assumindo e tendo orgulho de ser quem somos. Vale lembrar, também, como diz Rita Lee, que “nem toda brasileira é bunda”… ELA ESTÁ certa. Nesse caldeirão chamado Brasil, há espaço pra todas: pras magrinhas, pras gordinhas, pras bundudas, pras peitudas… NÃO SE PODE negar: nós brasileiras sempre fomos avantajadas, e agraciadas, em quadris e curvas sinuosas, que sempre inspiraram nossos artistas, de Di Cavalcanti a Oscar Niemeyer, passando pelo caricaturista Lan… TODA ESSA exuberância natural, fruto da nossa rica miscigenação, nos torna inigualáveis ao resto do mundo, o que agora as norte-americanas querem copiar, injetando bumbuns fake, como fez a Kardashian… POR MUITOS ANOS, influenciadas por padrões de beleza norte americanos e europeus, renegamos nossa beleza única, tentando nos enquadrar em formas utópicas… QUE OS DEUSES não me ouçam, mas a culpa é dos gregos, que, com essa obsessão por definir o que é belo e não belo, com seus corpos milimetricamente proporcionais, nos influenciam até hoje… NA GRÉCIA  Antiga já existiam concursos de beleza. Um deles, o da Aphrodite Kallipygos, também conhecida como Afrodite de belas nádega, Vênus Calipígia para os íntimos… A FIGURA DA deusa Afrodite estava fortemente associada à beleza, ao amor e à sexualidade. Dizem que Zeus proporcionou a ela os quadris perfeitos em troca de alguns prazeres (para os gregos, o bumbum era uma das mais belas partes da anatomia humana e, para nossa sorte, para os brasileiros também é)… NA PRÉ-História, a figura feminina chegou a ser representada por esculturas rechonchudas, com quadris, peitos, abdômen e coxas exuberantes… ESSAS ESTATUETAS, também chamadas de Vênus pelos arqueólogos, eram ícones da fertilidade e da abundância, possivelmente representações de uma Deusa Mãe Terra. A mais famosa delas é a Vênus de Willendorf, bem gorduchinha. Ai, ai, bons tempos aqueles… que rápido retornem…

As fotos são de Fred Pontes.

 

Brasil do desespero e dos desesperados

Hildegard Angel

O desespero nos massacra.
A incerteza de um Brasil caminhando sobre o fio da navalha amolada com o ódio.
A incerteza quanto ao futuro de nossa gente, nossa atmosfera, nossa água, nossas florestas, com as chaves de nosso presente e de nosso futuro entregues aos cuidados de um louco celerado, tudo isso nos descompensa.
Nos desintegra intimamente.
Dormimos e acordamos na insegurança de saber quantos mortos serão naquele dia, de doença, de fome, de arma de fogo, de desânimo, de relento e frio.
Um país movediço.
Este é o Brasil sombrio de Bolsonaro, fruto dessa aliança sórdida, que reúne políticos corruptos, fanáticos ignorantes, mídia perversa, gente ruim de todos os tipos e militares gananciosos.

Tivéssemos um botão vermelho para acionar a bomba atômica, ele, nosso feitor, Bolsonaro, inconsequente e tirânico, já o teria acionado.

Nesse desespero, as mentes delicadas, sensíveis, não suportam a pressão.
Ontem, se foram duas pessoas maravilhosas e frágeis. E não sabemos a real razão e exata.

Hoje, desconfia-se que a partida do artista indígena Jaider Esbell tenha sido por suicídio. Artista contemporâneo do povo Mucuxi, 41 anos, estrela incandescente da Bienal de São Paulo, no momento mais importante, fulgurante, de sua vida, honrado, elogiado, glorificado, nada disso foi suficiente para manter integra a frágil corda de violino Stradivarius que o ligava à vida.

Ela se rompeu tragicamente, causando nosso estupor.

Este não é um momento corriqueiro. Sobrevivemos na anormalidade, e os dotados de consciência abraçam de modo enérgico, e sem pensar em consequências, a causa de salvar o Brasil. Salvar o mundo. Salvar a Humanidade dependente de nossa natureza.
A causa de colocar esse governo em seu devido lugar: no chão.

Escreva eu uma odisseia, não falarei tanto e com a eficiência da obra de Esbell. Vejam aqui esse grito indígena parado no ar em seus trabalhos comoventes. Eu paro e lembro do grito do Tarzan da minha infância, do Jim das Selvas, de Raoni, o cacique do gravador, dos Irmãos Villas Boas, de Darcy Ribeiro, do pajé Sapaim, fazendo pajelança para salvar o ecologista Augusto Ruschi, o ecologista, naturalista, das orquídeas e dos beija-flores. Roguem por nós!

POR QUE GOSTAM TANTO DE PRIVATIZAR

Hildegard Angel

Gostam de privatizar para ficar com o que nos custou tanto construir.
Gostam de privatizar para lucrar sozinhos, enquanto o povo que se lasque.
Gostam de privatizar porque sao insensíveis, gananciosos, gelados, indecentes.
Gostam de privatizar porque se julgam os donos do Brasil. E são! Porque depuseram Dilma, quando quiseram. Prenderam Lula sem provas, quando bem desejaram. Entregaram o pre-sal, as refinarias, a distribuidora, e até o nome dos postos de gasolina eles mudaram.
Mandam porque, quando decidiram e quiseram, emplacaram um idiota na Presidência do Brasil, com faixa, rampa e Palácio.
Mandam porque a mídia corporativa come nas suas mãos, e é pra eles que, de verdade, os militares batem continência.
É pra eles que o Judiciário estende no chão suas togas e as páginas da Constituição, para pisarem em cima, sapatearem, requebrarem, sambarem.
São eles que determinam que o povo passe fome, que o Bolsa Família e o Minha Casa Minha Vida sejam extintos.
Eles decidem se as indústrias fecham e se o desemprego aumenta. Eles resolvem que os banqueiros sejam entupidos de dinheiro até lhes sair pelas narinas, e que os miseráveis morram de frio sob a chuva, e sem marquise.
Somos só meros trabalhadores, servos, escravos.
Somos figuração nessa comédia em que tucanos de bico largo abocanham tudo, promovem uma grande rachadinha nacional com os corruptos do Centrão (não era assim que os chamava o general Heleno?), e plantam um grande laranjal distribuído entre eles mesmos. Botaram a Petrobras no bolso com todos os penduricalhos.
Enfim, posso me estender aqui até o limite máximo de palavras e de revolta, e não terei dito tudo, e continuarei a ser nada, como os demais brasileiros.
Sem voz, sem esperança, sem ânimo e agora, também, sem futuro.
O país do futuro se tornou um presente monstruoso, graças a seu passado vergonhoso.

Judiciário brasileiro aposenta o Código Penal e implanta o Código da Conivência

Hildegard Angel

O relator, ministro Luís Felipe Salomão, do TSE, poderia hoje ter salvo o Brasil e feito História. Não fez. A sentença do TSE se resumiu a uma simples ameaça: se fizer de novo, será preso. Cometer crime de primeira, então, tá de boas, TSE? Disse o ministro Xandão: “A Justiça pode ser cega, mas não é tola!”,

Tolos devemos ser nós. As palavras engasgadas na garganta são Decepcionante e Revoltante.

Bolsonaro deveria ter sido preso ANTES do estrago monumental perpetrado no Brasil, que ele antecipou que faria, mas os doutos juízes do TSE decidiram HOJE que, se ele fizer DE NOVO, será preso.

Por sua negligência e insensibilidade, mais de seiscentos mil brasileiros morreram; por sua ignorância e presunção, a Amazônia foi queimada; por sua falta de compaixão, as armas foram liberadas, estimuladas, e seu controle cancelado. Por sua sabujice e falta de patriotismo, o Brasil foi destruído, com a entrega dos gasodutos, do pré-sal, das refinarias.

O Brasil virou a piada do mundo. Enquanto a direita não encontrar a terceira via, o país permanecerá na mesma. Esse 7×0 do TSE é prova de que nosso judiciário perdeu a mão, o pé, os músculos, o equilíbrio, a energia. A direita brasileira se garante entre eles: Judiciário, Mercado, Forças Armadas, Jornalismo, tudo farinha do mesmo saco, com objetivos comuns.

Não podemos ter ilusões. É essa a verdade que temos que elaborar internamente e aceitar.

Esse se tornou o padrão, desde que Moro perdoou Onix. A nossa Justiça é a do pré-primário: “Se fizer de novo, vai ficar de castigo”. O Código Penal caiu em desuso, agora vale o Código da Conivência.

Alguma dúvida de que um surto legalista do TSE aguarda o PT?

Inferno Brasil


Eles chegaram, cuspindo no chão, chutando o cachorro, mijando no muro, surrando as mulheres, arrotando alto, pisando na grama, esmurrando a porta, contando mentiras, prometendo bater, matar, estuprar. Transformando nossas vidas num inferno.

Ela se encantaram com tamanha grossura, pintaram a boca, se enfeitaram de verde e amarelo, e saíram em campanha, sonhando com o dia de serem elas as surradas, chutadas, xingadas. Nos convencendo que de idiotas está cheio o inferno.

E o que prometeram, eles cumpriram. Passaram o trator no jardim, na cultura, na ciência, nas artes, no ensino, na saúde, nos índios, nos pretos. Em vez de empregos, distribuíram armas. Em vez de vacinas, venenos. Cloroquina, em vez de comida. Poeira, em vez de florestas. Pavimentando seus próprios caminhos ao inferno.

Terra devastada, inferno.

Quando o sabiá não canta. Chora.

Foi forte. Foi emocionante. Foi necessário.

O programa Estação Sabiá, de Regina Zappa, na TV 247, fez Chico Buarque chorar. Não por motivo sentimental, não pelas memórias sufocadas, mas pelo prenúncio dos momentos terríveis, horrorosos, que estão sendo preparados para o Brasil por Jair Bolsonaro, o presidente das 500 mil mortes.

Esse horror tem nome: Ditadura. Quem viveu, como nós, sabe.

A Família Angel Jones

Em 05 de junho de 2021

Por Hildegard Angel

Norman Angel Jones com os filhos, Ana Cristina (2 anos), Hildegard Beatriz (1 ano) e Stuart Edgar (5 anos), no quintal de casa.

Hoje é o centenário de minha mãe, Zuzu Angel, que alinhavou, costurou e vestiu com seus carinhos essa família linda. Meu pai, Norman, meus irmãos, Stuart e Ana Cristina, e eu, caçula, no balanço. Ainda voltaremos a viver juntos e felizes novamente pela eternidade. Meus pais se separaram com 20 anos de casados. Meu irmão foi arrancado de nós pela ditadura. Minha irmã deixou o Brasil aos 20 anos. Mas em nossas memórias, dela e minha, prevalece este momento da foto, que nessa semana de tantas lembranças ela me enviou.
#zuzu100anos

100 Anos de Mamãe Grande. Gigante

Foto Antônio Guerreiro (Acervo Instituto Zuzu Angel)
Texto publicado em 05 de junho de 1921, data do centenário, em meus perfis no Instagram e no Twitter (#FioZuzu100Anos)
Amanhã serão 100 anos de nascimento de Zuzu Angel nossa mãe. De Stuart, Ana Cristina e minha. Levou sua maternidade até a última consequência. Até ser morta pelo Estado brasileiro. Talvez o assassinato político mais investigado de nossa História, alvo do escrutínio de três comissões federais, a dos Desaparecidos Políticos, a dos Direitos Humanos e a da Verdade. Com perícias, depoimentos, até de um delegado do Dops, que tudo revelou e confirmou, e de testemunhas oculares do desastre provocado na saída de um túnel, que hoje tem seu nome. Zuzu, mãe Coragem, brasileira patriota.
Zuzu Angel significou o ponto fora da curva na moda em nosso país, o ponto da consciência e da virada. Pois foi a primeira a denunciar a colonização mental e cultural de nossos criadores de moda, até mesmo os mais talentosos, que condicionavam suas criações aos padrões importados, fossem de estilo, técnica, cor e até de altura da bainha.
Zuzu foi um norte, uma bússola. Apontou o despropósito de os artistas da moda brasileiros, nesse país inspirador, solar, colorido, intenso em sua História, suas alegrias e dores, festas populares, heróis, mitos, flores, pássaros, matas, minérios, irem buscar inspiração, beleza e regras no Velho Continente cansado de guerra.
Zuzu rompeu com essa ‘prisão cultural’ e voou com os pássaros, se lambuzou com as mangas carlotinha, admirou matas, cheirou flores, ampliou limites e até ousou denunciar opressão, torturas, política assassina do Estado brasileiro na Ditadura Militar, com seus vestidos pueris, singelos, cheirando a quintal varrido das cidades do interior, com suas rendas coloridas balançando no varal, com suas toalhas de mesa de renda do Norte vestindo noivas, com suas contas de jacarandá, os bambus e as conchas bordando vestidos.
Enfim, Zuzu foi o Brasil, que era omitido em nossa moda, como se ela se envergonhasse dele, e só vestisse “tailleurs”, “drapées”, “pied de poule”, e outros termos franceses, ao invés de babado sim, babado não, bordado também, franzidos e fuxicos.
Zuzu foi mineiramente inteira no que produziu, e deixou o legado da elegante legitimidade, da franqueza pueril, da moda com sotaque da nossa História.
Deixou o ensinamento de que só se recupera uma Democracia comprometida à força de muita resistência.

*FUDIDOS DE VERDE E AMARELO

 

Hildegard Angel

Vendo o Brasil seguir escoando pelo bueiro. Vai, Brasil, diluído em sangue, água suja, chorume e vômitos dos doentes. Sentada no meio fio da História, acompanho com os olhos e um nó no peito o caminho célere da Nação, dissolvida em óleo de cloroquina, até o ralo dos infernos. Segue, altiva, e por vontade própria.

O Brasil se encaminha de peito inflado e cabeça erguida na direção do cadafalso. Hipnotizado por inverdades, abduzido pelas falsas versões, lá vai ele, em inocente ignorância, com o pescoço já azeitado para facilitar a lâmina da guilhotina. Vai de verde e amarelo, dançando funk no tik tok, alegre, risonho, espalhafatoso, como é de sua ingênua natureza, bradando hinos e palavras de ordem. “Fora STF”, “Fora Congresso”, “Pela intervenção militar”, “Queremos nosso Brasil de volta”.

Não bastou o Mensalão encarcerar os sobreviventes combativos de 68. Não bastou o golpe interromper o mandato da presidenta honesta. Não bastou a Lava Jato destruir nossa indústria da construção, a indústria naval, nosso projeto nuclear, nossa indústria de óleo e gás. Não bastou a prisão ilegal de Lula. Não bastou a retirada dos direitos do trabalhador brasileiro. Não bastou o massacre de nossas pensões e aposentadorias. Não bastou o rolo compressor no ensino básico. Não bastou a precarização máxima das universidades públicas. Não bastou o corte de nossos programas de bolsas de estudo e incentivo à Ciência. Não bastou a satanização da Cultura, através do falseamento da Lei Rouanet. Não bastou o projeto de destruição do SUS, a redução drástica dos leitos, os cortes de verbas.

Não adiantou a devastação recorde de nossas florestas, a liberação de invasões pelos grileiros do grande capital, o assassinato dos indígenas pelos bandidos do garimpo. Não bastou o desmonte dos órgãos de controle de tudo. Não bastou a liberação de armamento pesado para bandidos e milicianos. Não bastou o aparelhamento da AGU, da PGR, da Polícia Federal, da Receita Federal, do Judiciário. Não bastaram os três bilhões para o Centrão. Não bastou a venda fatiada da Petrobrás. Não bastou a entrega de nossos aquíferos ao projeto da privatização.

Não bastou o sufocamento dos programas sociais. Não bastou a volta dos pratos vazios, a epidemia da fome. Não bastaram as latas de lixo revirando restos, os esquálidos de mãos estendidas nas calçadas, crianças chorando nas ruas porque têm fome. Não bastou faltar leitos nos hospitais para os doentes e covas nos cemitérios para os mortos. Não bastou meio milhão de brasileiros exterminados pelo descaso, a inépcia, o projeto de morte de um genocida, que se compraz com o sangue derramado, pois sua especialidade – declarou –  “é matar”.

Agora, a horda ensandecida, que capturou nossa Bandeira, quer uma ditadura, grita por ela, implora, discursa. Quer a repressão dos diferentes. Quer o pensamento enclausurado, bocas caladas, línguas arrancadas.

E já nos furam os olhos à bala. Já nos prendem por nos manifestarmos. Já exigem o porte de documentos. Já nos incriminam se estamos em grupo. Já censuram a mídia independente através de ações judiciais, com sentenças espúrias e multas, que ninguém pode pagar. Jornalistas oprimidos já se reúnem em vaquinhas solidárias, para poder continuar a falar, a denunciar, a ser.

E continuam a achar pouco.

*Considerem a palavra chula grafada ‘no popular’ uma licença poética de quem cresceu e viveu evitando dizer e escrever palavrões, mas meu copo, até aqui de mágoa, apreensão, tristeza,  transbordou.