Coronamorte – Carta para Paulinho

Mirna Bandeira de Mello. O coral era sua cor, estava em suas paredes, cadeiras, nos vestidos e no batom. Para o hinduísmo, é cor sagrada, representativa da leveza e da sabedoria. Foto de Marcelo Borgongino na festa de aniversário de Paulo, a última de Mirna que postei aqui, em dezembro passado.

 

Vejam a situação em que estamos. Isolados, sem sequer a condição de enviar por mensageiro ou Correio uma carta de pêsames a um amigo, que acaba de perder a mulher de sua vida toda, vítima do coronavírus, coronamorte. Tenho apenas o WhatsApp de Mirna, não o dele, e o telefone não me parece um bom meio para uma manifestação de pêsames.

Faço então deste blog meu correio de sentimentos.

Querido Paulinho,

Espero que você leia este WhatsApp no celular da Mirna. Sua morte foi um choque enorme para todos. A mais autêntica, natural e legítima de sua geração na sociedade carioca. Sem afetações, suave, genuína. E bondosa. Vai nos fazer grande falta. Era o equilíbrio da balança. E sempre sofrendo para acertar o ponteiro de sua própria balança. Quando nos encontrávamos, trocávamos histórias sobre nosso excesso de peso, experiências, dietas. E ríamos. Ela sempre com bom humor, sem um pingo de ressentimento. Comovente sua dedicação a Vânia, sua mãe de estimação. E sua última preocupação foi não contagiar os netos e a cachorrinha! Esta, a Mirna.

Faz refletir que seja aquela mulher discreta, sem vaidades ou exibicionismos, a primeira referência de vítima fatal do vírus na elite brasileira. De certa forma, com todo o sofrimento que ela passou e com toda a melancolia em que nos deixou, sua morte não terá sido em vão. Mirna foi o primeiro sinal de alerta da real gravidade e do risco que representam essa doença. O balde d’água em nossos rostos, o alarme que soou forte em nossas mentes nos retirando do estado de susto e letargia em que nos encontrávamos. Um choque do real. Mirna não morreu em vão. Partiu primeiro para salvar muitas vidas.

No momento em que soube de sua morte, fiz um registro breve e triste no Twitter. E veja aqui a imediata resposta no aplicativo, em número de impressões de pessoas que se detiveram na leitura do post, curtiram, comentaram, compartilharam. Quase um milhão e meio, que talvez no fim de hoje cheguem a dois milhões. São mensagens sentidas, emocionadas, solidárias, como se todos conhecessem a grande pessoa, de espírito alegre, que Mirna soube ser. Na vida eterna, onde agora está, ela há de ficar muito triste se nos perceber entregues ao abatimento. Vamos reagir!

Vou lhe fazer uma confidência. Logo que começou essa hostilidade entre as pessoas, dividindo-se entre direita e esquerda, bolsonaristas e lulistas, Mirna me ligou: “Hilde, sou sua amiga. Meu pai também adorava você. Você sempre foi amorosa conosco, comigo, Paulinho, Vania, nossos filhos. Não quero saber se suas posições políticas combinam ou não com as minhas, só quero que você continue aceitando nossos convites, e sejamos sempre amigos”. Que mulher nobre a sua, Paulinho. Parabéns!

O meu beijo para você, os meninos, noras, netos e nossa amada Vânia. Francis lhe envia seu sentido e afetuoso abraço.

Hilde

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