Josias Cordeiro com sua “Santinha”, Heralda, que partiu antes dele, e agora se reencontraram
No ofício religioso de ontem, 6 da tarde, a Igrejinha branca com janelas azuis de São Conrado estava lotada, com bancos extras nas laterais, todos ocupados. Era a missa de sétimo dia pela alma de Josias Cordeiro, “o estereofônico Josias”. Megafônico, mastertrepidante, Josias fez o society do Rio de Janeiro sacudir o esqueleto, nos anos 70 e 80, ao ritmo de suas aparelhagens de som customizadas e poderosamente amplificadas.
Montadas com aço escovado, placas de acrílico, luzes coloridas e equipamentos de última geração, as mesas do Josias eram o objeto de todos os desejos, sinal de status, coroação de qualquer ambiente dos 70’s, ponto alto das decorações de residências milionárias ou quase isso, que todos, quando inauguravam ou repaginavam suas casas, faziam questão de exibir em grande estilo, promovendo altas festas dançantes, com as caixas de som em potência máxima.
Josias, Josias, Josias, uma epidemia, coqueluche, mania. A marca que caracterizou uma época. Sérgio Dourado e Suzette, Carlos Carvalho e Maria Raquel, Marcos Tamoyo e Belita, Mario Ribenboim e Solange, Antonio Mac Dowell da Costa e May, Flavio Teruszkin e Adalgisa, Albino Avellar e Maria Laura, Nelson Seabra Veiga e Idinha, John Lowndes e Lyginha, Eurico Amado e Helô – depois apenas Helô, Lelia Gonçalves Maia, José Pedroso e Lucia – depois apenas Lucia, Milton Cabral e Myriam, Newton Lins e Patrícia, Antônio Galdeano, Ronald Levinsohn e Henriqueta, Leda Lage, Newton Rique e Regina, Sivuca Malta, Ibrahim Sued, José Carlos Galliez Pinto e Sarita, Luiz Felipe Índio da Costa e Marly, Mario Priolli e Maria de Fátima, os Gouthier, os Pitanguy, os Chermont de Britto todos, os Borges, os Sève, Nonô inclusive, os Penna Marinho todos, os Palhares todos, os Monteiro de Carvalho todos, Murilo Meirelles e Rosinah, Paulo Maia e Flávia, Alberto Pittigliani e Teresinha, Paulo Marinho e Odile, Ricardo Amaral e Gisella, Paulo Fernando e Regina, Eric Waechter e Martha, Celidônio e Marialice, Jorge Guinle e Tânia Caldas, Pedro Augusto Guimarães e Helena, Márcio Braga e Noelza, Jorge Veiga e Nelly, Oscar Bloch e Inês, Sergio Figueiredo e Yolanda, Moema Jafet, José Rodolfo Câmara e Lucia, Paulo Vianna e Sony, Maurício de Carvalho e Lucianita, Luís Fernando Santos Reis e Sônia, Homero Leal de Meirelles e Terezinha, Roberto Andrade e Yara, Bebeth Freitas com o Rui, Martha Rocha (já sem Ronaldo Xavier de Lima), Theo Atherino e Nair, Mauricio Zacharias e Glaucia, Carlos Alberto Vieira e Carmen, Júlio Fabbriani e Dayse, Glorinha e Luiz Cesar Magalhães (depois, Glorinha e Carlos Moacyr Gomes de Almeida), Alfredo Castro Neves e Leda, Eliana Moura (e Zé Prior), Renato Garavaglia e Kiki, Hélio Fraga e Silvinha, Marcio Segia e Cristiana (Neves da Rocha), Alfredo Thomé e Jacyra, Maurício Stambowsky e Nieta e tantos outros nomes absolutos dos setenta promoveram, protagonizaram ou foram personagens de noites dançantes intermináveis, inebriantes… borbulhantes…
Ao som do guru sonoro Josias, a exclusiva multidão de chics e abonados saracoteou duas décadas seguidas na pista do Hippo, cuja mesa de som era, naturalmente, by Josias.
Para um aficionado do som de Josias, o must era ter uma boate inteira montada por ele. Era consagrador. Numa época da vida em que todos os amigos estavam em máximo vigor, uma geração que não levantou ferros nas academias na adolescência, et pour cause não sofreu de problemas precoces de joelho, artroses e tendinites, todos podiam dançar e se acabar nas pistas de dança a madrugada inteira, fossem eles trintões, quarentões ou mesmo cinquentões – até sessentões! Ninguém negava fogo.
Albino Avellar foi o primeiro a inaugurar uma boate by Josias, em sua casa de Petrópolis, onde recebia com Maria Laura para um pré-carnavalesco tradicional, que deixava as pessoas alucinadas por convite. Em seguida vieram muitas outras boates by Josias. A última, que eu me lembre, foi a de Françoise e Alberto Boruchovitch na casa da Barra da Tijuca, muito bem instalada, show! Todas elas com a obrigatória bola de espelhos giratória, marca da década ‘disco’. A década Josias.
Vejam vocês como Josias é inspirador. Comecei a falar dele e acabei discorrendo sobre o Rio de Janeiro dourado, que ontem estava lá, atento, na igreja, escutando padre Marcos contar que Josias se tornara assíduo frequentador das missas dominicais, quando, em longas conversas com ele, filosofava: “só saberei conviver com os outros quando aprender a conviver comigo”.
De fato, apenas a doce-como-pão-de-mel Heralda, que ele chamava de “santinha”, dominava a fórmula do bom convívio com Josias. Imprevisível, carismático, guiado pela inspiração do momento e movido por impulsos sempre surpreendentes, em vez de um casamento convencional, Josias proporcionou a Heralda um permanente Parque de Diversões. Ora saltitavam num Carrossel de Cavalinhos, em total encantamento, numa espiral interminável de festas, que podiam ser no Rio, em São Paulo, Nova York ou até como convidados para o fabuloso aniversário de Frank Sinatra em Las Vegas, ora estavam num Trem Fantasma, levando um baita susto, com a vida comercial de Josias virando de ponta cabeça, para em seguida se recuperar ainda com maior brilho, pois tino criativo para superar obstáculos era com ele mesmo.
Tudo em se tratando de Josias era singular. A mãe de Josias, uma instituição, era Josias de saias, e a ideia de envelhecer não estava em seus planos. A família Josias ocupava uma casa de quatro andares na Rua Barão de Jaguaribe, em Ipanema. A casa tinha, é claro, um baita salão de dança, mas imperdível era o quarto do casal, com inúmeros aparelhos de TV embutidos na parede. Um monitor para cada canal existente. Assim, ele podia manter ligados simultaneamente os programas de todas as emissoras, e aumentava o volume da imagem que mais o agradasse. Era o luxo do luxo numa época em que não havia TV a cabo.
Criativo, Josias ganhou as páginas até da mídia internacional com seu projeto das exéquias high tech. Durante o funeral, telões na capela mortuária exibiam documentário com momentos felizes da vida do morto, fotos do álbum de família, sua mensagem gravada aos amigos presente e, se fosse o caso, também aos desafetos. Equipado com alto-falante e aparelhagem de som sofisticada, o caixão podia transmitir hits musicais ao gosto do freguês, ao longo da eternidade. Josias chegou a receber encomendas, por inusitado que isso possa parecer. Uma sofisticação tecnológica tão avessa à simplicidade daquela missa discreta, na igreja de São Conrado, com singelas flores lilases e brancas cobrindo os balaústres diante do altar. Sim, Josias aprendeu a conviver consigo, sem precisar de caixas de som, bolas de espelho nem trens fantasma.
As conversas com padre Marcos, o afeto dos filhos Moniquinha e Joca, sempre por perto, e a perspectiva do reencontro com Heralda ajustaram, pouco a pouco, o ritmo acelerado de Josias. Com a intuição atilada e o senso de sincronicidade próprio de um bom DJ das suas mesas de som dos anos 70, ele percebeu que a faixa de seu vinil na Terra estava expirando e que já estava prestes a se iniciar, no mesmo ritmo, métrica e velocidade, a faixa de uma nova vida, ao lado de Heralda, que o aguardava sorridente e doce, como sempre, porém firme, e cheia de personalidade. Só por isso foram tão felizes. E assim continuarão a ser, ao som de hits pela eternidade…
Hilde, muito obrigada pelas lindas palavras! Realmente meus avós eram pessoas únicas! Aprendi com eles que a vida é para ser vivida com alegria e amigos…
Beijo carinhoso
Duda
Hilde querida. Só vi agora esse lindo texto com seu carinho tao grande por meu pai e minha mae.
Tenha certeza que era reciproco esse carinho e agradeço, muito emocionada, as sua palavras.
Beijo grande da Moniiquinha…. Josias.
Mônica, eu trabalhei com vocês na loja de Ipanema. Adorei essa época, aprendi muito com teu pai, você e com o Joca. Sinto muito pela perda!
(AVELINO, o português).
Foi bom ler sua matéria, cara Hilde. Desde os anos 60, acompanho as principais colunas sociais do Rio. Borbulhantes, Zózimo, Ibrahim Sued, Fred Suter, Maneco Muller e tantos outros que fizeram história.
Gostei de ler nomes de socialites que não mais pontificam nos blogs porque hoje não temos mais colunas sociais de verdade.
Foi uma viagem no tempo.
Parabéns pela sua excelente memória.
Nunca mais o Mundo verá como os 70′ foram incríveis.
Parabéns pela matéria.
Que saudades das noites by Josias.
Mesmo para quem nao conviveu com ele, a Hilde consegue nos transportar `aquela época e `aquele ambiente, como se fosse hoje. Esse eh o dom de poucos jornalistas…
Oh… que bela e histórica descrição. Sente-se desejo de ser partícipe de tão mágicos e prazerosos momentos.
Hilde você cada vez se supera, Josias era uma pessoa fora de série mesmo, conheci pessoalmente pois meu pai trabalhou com ele como seu motorista e cada retorno p casa tinha uma história mais engraçada que a outra p contar.
Quando eu for embora desta para melhor, por favor escreva umas palavras, no seu teclado mágico viramos um super astro, mas na verdade quem é fenomenal é você como a rainha dos colunistas, um beijo afetuoso do seu amigo Toninho das Tshirts
Em suas palavras, Hilde, uma bela homenagem ao Josias e Heralda.
Um abraço,
Angela Adnet
Seu relato de hoje me deu uma saudade imensa dos anos setenta, apesar de ter que conviver com aquela atmosfera de chumbo.
Oi, sou sua admiradora e lendo sua postagem hoje me deu vontade de ter notícias de duas pessoas, cujos passos acompanhei, menina fascinada pelos concursos de miss: Martha Rocha e Terezinha Morango. Sou carioca, acompanhava as tarde de Grande Prêmio Brasil no Jockey Clube r seu texto me deu saudades da infância. Hoje moro em São Paulo
Grata pela atenção.
Mais uma homenagem póstuma tão bela que em vez de lamentar uma partida, sorrio por nos trazer esse Rio dourado , onde nele dançamos prazeirozamente, ao som do Josias,
Obrigada Hilde
Que saudades da epoca que Josias, era o rei da noite ! Suas boites, o ” Som Josias”, era fator importantíssimo no Rio Maravilha daquela epoca ! Heralda, sempre linda e discreta, a sorrir com as loucuras eletronicas do marido ! Certamente estão escutando o melhor das musicas lá de cima !