Neuza e Luís Carlos Silveira, com as filhas Rochelle, Mariella, Bárbara e Evelise – a Família Kurotel, o Kur, como é carinhosamente chamado pelos
habitués, que pelo menos uma ou duas vezes por ano sobem a Serra gaúcha em busca da medicina preventiva, que garante longevidade com saúde; novas técnicas e métodos medicinais, unindo o “human touch” ao
“high tech”, isto é, alta tecnologia, mas humanizada.
Comecei a ir ao Kurotel, quando era chamado apenas de Kur. Calculo em torno de 15 ou 20 anos atrás. Achava o nome estranho, desconhecendo ser a palavra, em alemão, para cura. Instalado na inspiradora cidade de Gramado, uma joia germânica incrustada na Serra gaúcha, o Kur me pareceu ter sido transplantado ali, trazido diretamente da Floresta Negra. Um terreno cheio de pinheiros, jardins floridos abraçando o prédio, funcionários vestidos pelo maior estilista do Sul do país, Ruy Spohr, que desenvolveu uma coleção para toda a equipe do hotel-spa-clínica, que de tempos em tempos era atualizada com pequenas mudanças, mas mantendo o espírito original.
Era como se todos os trabalhadores, pessoal da portaria, do escritório, garçons, cozinheiras, jardineiros, arrumadeiras, massagistas, esteticistas, instrutores físicos integrassem o elenco de uma megaprodução do cinema musicado, “A Família Trapp”, que aqui levou o nome de “Música divina música”. As mulheres, independendo da função exercida, eram lindas frauleins louras, de olhos azuis, altas, e de coque na nuca preso com um laço preto. Arrumadeiras com vestidos de mangas longas e bufantes de algodão, bainha abaixo dos joelhos, tecido quadriculadinho ou listrado, e sobre eles o avental branco de fustão engomado, um palmo mais curto do que o vestido, com faixas que se cruzavam, fazendo um X nas costas, terminando com um laço na cintura, e a necessária touquinha. Meias brancas e sapatos brancos. Dava vontade de ter roupa igual. Pela minha formação de filha de estilista, sempre presto grande atenção aos figurinos.
Mas havia outros itens que se destacavam: a cortesia, a educação de todos, que sempre diziam bom dia ou boa tarde àqueles com que cruzassem pelos corredores, a voz baixa, jamais alterada, a seriedade com que exerciam suas funções, a eficiência, a preocupação com cada um dos hóspedes, individualmente, não como membro de um grupo. Sabiam nossos nomes, e respeitosamente me chamavam de “dona Hilde”. Nos quartos, os roupões brancos, com escudo dourado do Kur, sempre limpos, dobrados e amarrados com uma fita de gorgorão, o chinelinho atoalhado do Kur. As sacolas de lona com nossos nomes, eram acessório obrigatório o dia inteiro, no cumprimento da agenda de tratamentos clínicos, físicos, anti-estresse, exercícios, dança, meditação, yoga, aparelhos de musculação, hidroginástica, exames clínicos moderníssimos, as massagens estéticas, consultas com psicólogo, cardiologista, nutricionista, a enfermagem, para pesar, medir, tirar pressão, as refeições no restaurante, os lanches. E a sacolinha junto, levando a agenda impressa, roupas para trocar, entre uma e outra atividades, dispensando as idas e vindas ao quarto. Eu já havia frequentado spas, mas nada que de longe se parecesse com tal profissionalismo médico e técnico, junto com a excelência de uma hotelaria cinco estrelas.
Somos brasileiros. Estamos acostumados a ver estabelecimentos incialmente ótimos irem declinando, piorando, precarizando seus serviços e produtos, até fechar. Sempre o mesmo ciclo. Com o Kur, no entanto, constato o oposto. A empresa vai se aprimorando e adequando a cada tempo. Hoje, as funcionárias não são frauleins. São brasileiras de várias partes, e os cabelos, assim como os olhos, variam de cor e de penteado. O coque na nuca ficou no passado. E os hóspedes são tratados de modo mais moderno e casual. Deixei de ser “dona”, passei a ser “Hilde” para todos. Permanecem, contudo – e ainda bem – os inspirados figurinos de Ruy Spohr, que enquanto vivo realizou as adaptações necessárias aos originais, e continuam a ser atualizados pela família Kur, os Silveira.
O que mais muda são os cardápios e as dietas, já que na ciência nutricional são frequentes as novas descobertas e mudanças de orientação. Também afinado com as inovações da ciência, o Kurotel tem agora um setor de genética, nesses tempos em que se pode antecipar diagnósticos a partir da leitura do DNA.
O Kur foi fundado há 40 anos pelo casal Luiz Carlos e Neuza Silveira, no mesmo local. Ele, quando chegou a Gramado em 1971, era o único médico da região. Atendia no consultório, em domicílio, no hospital, todos os tipos de casos, e até parto realizava. Não cobrava no fim dos atendimentos, deixava a missão para uma secretária, que anotava num caderno preto cada procedimento, e depois realizava as cobranças. Não era incomum pacientes se esquecerem de pagar, mas essa era a prática do médico, que priorizava a relação de confiança com os pacientes. Como efeito, defrontou-se com todo o tipo de excentricidade. Como o parto de uma cigana, que, quando o marido ouviu da secretária do doutor que tinha um débito a saldar, propôs uma troca do parto por bacias de cobre, que fabricava. As bacias do cigano eram de lata esmaltada para parecer cobre, como é prática, aliás. Dr. Luiz Carlos preferiu deixar o débito para ser pago um dia qualquer, “na bacia das almas”. E lá está o calote pendurado, entre vários outros, na sua biografia de homem que não sabia cobrar dos desfavorecidos.
Os menos favorecidos, obviamente, não frequentam o Kurotel, luxo possível para quem tem recursos e para quem tem consciência de que nosso maior bem a preservar somos nós mesmos, nosso corpo, nossa mente, nosso espírito. Um spa-clínica completo era um sonho acalentado por Luiz Carlos, desde sempre. Neuza, com formação em assistência social e grande administradora, aliou-se ao marido no projeto, e juntos abriram as portas do Kur, todo lindo e equipado, num dia 26 de março de 1982. Abriram e esperaram os clientes. Não veio nenhum. Na primeira semana, na segunda…
Mas pouco a pouco vieram os primeiros clientes, e os próximos, e os demais, tornando-se o Kur um sucesso, referência de Gramado, e ouso dizer um agente impulsionador da cidade. Logo, a hotelaria local passava a se espelhar nos cuidados e requintes do Kur, e também no seu pessoal treinadíssimo. Volta e meia, “roubavam” um funcionário, o que não abalava o empreendimento, que foi projetado já com a previsão de que isso aconteceria. Novos funcionários, massagistas, esteticistas, fisioterapeutas etc. eram formados, e o mercado de trabalho da região se enriquecia com a mão-de-obra altamente especializada e sofisticada. Foi a empresa certa na cidade certa.
Logo, a imprensa se interessaria em conhecer e mostrar o Kur. Foram e são quilômetros e quilômetros de reportagens, fotos, vídeos, entrevistas, capas de revistas, notinhas e colunas sociais, matérias em revistas de saúde, beleza e bem-estar. O Kur tornou-se uma estrela tão fulgurante quanto algumas de suas primeiras clientes e adeptas. A saber: Tônia Carrero (a primeira a me falar a respeito, e insistir que eu fosse ao Kur), Glória Menezes (logo depois), Fafá de Belém e outras centenas mais. Fernanda Montenegro me disse que foi duas vezes ao Kur, sempre apresentando temporadas teatrais em Porto Alegre para esticar até Gramado. E querendo voltar.
Minha primeira vez no Kur não esqueço. Foi com as amigas Consuelo Pereira de Almeida e Déa Bornhausen, então primeira-dama de Santa Catarina. Como nos divertimos! Entre papos, massagens, aulas de hidro em piscina coberta ou tomando sol na piscina descoberta. Essa mágica da interação entre as pessoas ocorre com todos, mesmo os mais reservados. O fato de se passar o dia todo, de lá pra cá, de roupão, cabelos molhados, sem afetações, vai tornando as pessoas mais francas e comunicativas, como se retirassem sua capa protetora. E logo estão confraternizando nas mesas redondas de café da manhã, almoço, jantar, abrindo o coração, fazendo relatos de vida. Recém-conhecidos se tornam amigos para a vida inteira. Fiz alguns, acreditem.
Luiz Carlos e Neuza tiveram quatro filhas, hoje já adultas. Elas cresceram frequentando o Kur, conhecendo todos os setores dessa máquina de perfeita operação. Não digo máquina bem azeitada, pois nas refeições do Kurotel azeite não pode. Todas as irmãs participam da empresa. Bárbara é do Conselho. Mariella cursou medicina e assumiu a direção médica. Evelise, também médica, é geriatra, e divide com Rochelle, formada em Administração, e Diretora Administrativa, a gestão do Kurotel. Luiz Carlos e Neuza presidem o Conselho e se mantêm numa supervisão de todos os setores.
As quatro filhas se casaram. Fui ao casamento de duas. Dos mais bonitos e criativos a que já compareci. Os netos já são 10. E para comemorar os 40 anos da vida empresarial, afetiva e familiar bem sucedida, depois do jantar festivo no Kur com amigos e clientes, os Silveira foram todos, com filhas, genros e netos, para uma temporada no chamado “único resort cinco diamantes do mundo”. O Xcaret, no México. Eu já os imagino observando o funcionamento do hotel e parque lúdico mexicano, com direito a zoo. Devem estar vendo, comparando, criticando e colecionando ideias, se houver. O profissional que ama o que faz sempre colhe referências onde vai.
A minha vida, nos últimos quase 20 anos, esteve ligada ao Kur. Não só pela admiração que desenvolvi por essa família única, como também pelo produto que oferecem. A cada vez eu me renovo, aprendo e meu organismo inteiro agradece. Quando Neuza me telefonou para convidar para a comemoração dos 40 anos, dei uma olhada no espelho e constatei como o isolamento da pandemia havia maltratado meu corpo, meu rosto, minha mente, minha saúde. Eu precisava de uma revisão geral urgente. Entrar naquelas máquinas de imagem que nos passam a limpo. Foram 17 dias concentrada exclusivamente em mim, desligada de tudo. Bem, de quase tudo. Faço com gosto e por emergência cívica.
Neuza e Luís Carlos Silveira, na festa dos 40 anos do Kur, inauguraram um Memorial que conta toda a sua História magnífica
Um livro de receitas com os 40 pratos de mais sucesso do spa, q inauguração do Memorial Kur, contando sua história em forma de arte, exposição e tecnologia foram parte das comemorações, assim como nova exposição da
Galeria de Arte Mamute, que fica dentro do Kurotel, focada no ser humano; novo
vídeo institucional e o lançamento de um roupão com releitura do logo assinado pelo
estilista Amir Slama
No avião de volta, depois de duas horas descendo de carro a serra de Gramado a Porto Alegre, vim lembrando o jantar dos 40 anos, seus pratos com requintes e aparência da melhor culinária francesa, mas sem engordar 1 grama. E a delicadeza de a louça do prato principal vir com o nome, inscrito na borda, de cada um dos 50 ou 60 comensais daquela noite feliz e mágica, que celebrava não só o 40º aniversário de uma empresa vitoriosa, mas a certeza de que o Brasil consegue produzir qualidade, obtendo todas as premiações internacionais possíveis, quase sempre no topo das classificações; que o Brasil sabe formar mão de obra refinada para o mais exigente consumidor; que o Brasil, com todas as dificuldades criadas por entraves e burocracias, é capaz de dar continuidade a um projeto de tal forma importante, a pesquisas sobre longevidade e prevenção que poucos grandes centros internacionais médicos e de pesquisa científica desenvolvem.
Parabéns, família Kur, os Silveira e todos os demais, parabéns àqueles hóspedes que há décadas encontraram e percorrem repetidamente o caminho rumo a esse paraíso.
Vou repetir aqui a abertura da primeira matéria que escrevi sobre o Kur: “Quando chegar ao Céu e São Pedro vier me perguntar se quero conhecer o Paraíso, direi: o Paraíso eu já conheço, pois estive no Kur”.
Noite da festa dos 40 anos, que consistiu na inauguração do Memorial, em show musical, coquetel regado a champagne Kur, zero álcool e zero açúcar, discursos afetivos, amigos e mais amigos, e um jantar com as receitas de excelência do Kur. Aqui estamos, eu e Francis Bogossian, meu marido, Luís Carlos e Neuza Silveira, também celebrando nossas décadas de amizade e fidelidade (nossa) a esse projeto.
Você é tão esquerdista e só anda na high Society! O Kur é um dos melhores lugares do mundo, mas para gente sincera!
Hidelgard, no ano de 1992, conheci uma conhecida tua, a Cristina, tia das tamborindegues. Sabe dizer dela? Morava na Vieira Souto, 6. Filha de uma irmão do João Saldanha.
Hildegard,
Boa tarde! Tudo bem? Acompanho o seu blog a muito tempo! Gostaria de saber se você tem algum e-mail pra que eu possa te passar uma notícia. Na verdade é uma fofoca, das mais bem guardadas dos últimos tempos. Acho que você gostaria de saber no mínimo e ficar de olho.