Inauguração da Biblioteca Nélida Piñon, no Instituto Cervantes

Por Hildegard Angel (Coletivo Jornalistas Pela Democracia – Brasil 247)

Nélida Piñon aplaude o concerto da Jovem Camerata do Rio de Janeiro, na cerimônia de inauguração da Biblioteca Nélida Piñon, no Instituto Cervantes

Homenagem a Nélida Piñon de tal jeito formidável, que trouxe ao Rio de Janeiro, vindo de Brasília, o Embaixador Fernando Garcia Casas, da Espanha, e uma comitiva daquele país, incluindo entre outras personalidades o presidente dos 80 Institutos Cervantes de todo o mundo.

Presentes, nossas mais importantes instituições literárias, a Academia Brasileira de Letras, a Carioca de Letras, o Instituto Histórico e Geográfico, o Pen Clube. Um buquê farto de imortais das Letras, a começar por Domício Proença, que saudou a homenageada, imortal nos quatro cantos do mundo, Nélida Piñon, brindada com biblioteca com seu nome, ocupando dois andares do Instituto Cervantes, em Botafogo. Lá está guardado todo o acervo de livros da escritora. Os livros escritos e os lidos (em torno de oito mil volumes), desde a primeira cartilha da infância ao grego Homero, da adolescência, com suas “Ilíada” e “Odisséia”, às obras completas de Cervantes, romancista que ela classificou como seu “preferido”, na entrevista concedida depois ao embaixador espanhol.

Ao presentear seus livros, Nélida doou o mapa de sua formação, suas influências,  a literatura que a formou escritora, mulher brasileira, também com a cidadania espanhola, não por tê-la pedido – “seria uma ousadia”, ela diz. Foi a Espanha que se ofertou a ela em reconhecimento ao seu talento e ao amor sempre demonstrado ao país. À Galícia de seus ancestrais.

Obras aconchegadas em prateleiras brancas e os livros raros com direito a vitrine, fechadura e chave. Com a mesma delicadeza com que Nélida trata e cultiva suas predileções, foi montada, no corredor da entrada, uma galeria de fotos a partir de seus avós e pais. A mãe, vestida com andorinhas em revoada. Baby Nélida. A adolescente, com cabelos à Jeanne D’Arc. E pequena amostra das suas consagrações: a entrega do Lazo de Dama, de Isabel La Católica, outorgado pelo Rei Juan Carlos, de Espanha, até seu registro vestida com pelerine de cetim azul claro, na solenidade do Honoris Causa conferido pela Universidade de Santiago de Compostela. Nélida foi a primeira mulher em 503 anos a receber o título.

A mostra fotográfica é apenas um ‘amuse bouche’ na lauta coleção de títulos, prêmios, troféus, homenagens à escritora publicada em mais de 30 países, com 25 obras escritas, primeira mulher a presidir a Academia Brasileira de Letras. O vocabulário gastronômico harmoniza-se com a personalidade de Nélida, que, conforme revelou o embaixador, gosta de receber em sua casa com prodigalidade, influência da herança da Galícia, onde “em mesa farta, nunca falta”, lembrou García Casas.

Restrito grupo, 40 escolhidos com a pinça de seus afetos e das altas considerações. A primeira a chegar foi Fernanda Montenegro, com o rigor da atriz que jamais se atrasou em toda a carreira na cena. É amiga de Nélida de se falarem diariamente. Da ciência, Margareth Dalcomo. O intelectual do samba, Haroldo Costa, com Mary Marinho. Das artes plásticas, Gonçalo Ivo. Da museologia, Paulo Knaus. Da literatura, Sergio Fonta, Zuenir Ventura, Sergio Abranches, Ricardo Cravo Albim, Victorino Chermont de Miranda, Bia Corrêa do Lago, Claudio Aguiar. O diretor do Instituto Cervantes, Luís García Montero.

O escritor e acadêmico espanhol Antonio Maura, também diretor do Cervantes, abriu a cerimônia, saudou Nélida e anunciou a apresentação da Jovem Camerata do RJ, com músicos talentosos das comunidades cariocas, que breve irão se apresentar na Espanha e desfrutar de bolsas de estudos concedidas pelo Instituto. Encerraram o recital com Carinhoso – o carinho era a tônica da reunião. Gonçalo Ivo me cochichou: “São esses que reconstruirão o Brasil”.

O embaixador Garcia Casas saudou também a presença de Fernanda Montenegro e discorreu sobre os laços que ligam seu país a Nélida Piñon, primeira escritora de língua não espanhola a merecer homenagem como aquela prestada.

Juntei frases de seu discurso num só texto: “Nélida se vale do particular para escrever o universo. Escritora de altíssimos méritos, ela pensa o cotidiano, a condição humana, contribui para a construção maior da literatura brasileira. Escritora do Brasil e do mundo, no universo de Nélida a Espanha e o Brasil se irmanam. Uma das grandes escritoras universais contemporâneas, personalidade literária máxima da cultura da Galícia, de que é descendente. Nélida é fundamental. Lembro a emoção que senti ao ler seu “A República dos Sonhos”, o peso da imigração de Espanha no Brasil, obra em que analisava suas raízes do mundo universal. Os valores culturais que defendemos são muito bem encarnados por Nélida Piñon. O barco que trouxe sua família a esta “república dos sonhos” tem mais um prato aqui, no coração do Instituto Cervantes.”

Saí, pensando: “Que o barco Brasil volte em breve a ancorar na república dos nossos sonhos, pois a tripulação para conduzi-lo já temos: os jovens músicos das comunidades pobres, da Camerata, que mescla talentos, raças e um ardoroso desejo de superação.”

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